Ontem.
Ontem eu vi
uma arena iluminada virar um caleidoscópio de delícias. Vi redoma de flores, escuro
preenchido de aplausos, peraltices de luzes saltitantes. Ontem eu vi um vestido
vermelho sonhado de azul.
Ontem eu
ouvi o silêncio entre uma batida e outra do tambor do coração; ouvi
pau de chuva, canto suave, grito tosco, violino arranhado no escuro. Ontem eu
ouvi vozes.
Ontem eu vi
uma moça se mover com uma seringa agulhada no pescoço, cantando o desespero de qualquer
uma de nós. Sem efeitos especiais, sem truques de montagem, sem playback. Com um
corpo, uma existência e uma aflição.
Ontem eu vi
um homem acanhado brotando sementes dos bolsos, dos sapatos, das dobras da
roupa, das dobras da vida.
Ontem eu vi mulheres
desnudarem seus corpos revelando nossas próprias vivências. Vi peles expostas e
desejos de sermos nus.
Ontem eu me
vi vivendo outras vidas e vi outras vidas vivendo de mim. Vi brincarem a sério
com a dor e a delícia de existir. Entendi, desentendi, alucinei, escapei, revigorei,
embriaguei, despertei; me acabei de tanto rir.
Um sonho de olhos abertos, uma viagem para dentro, uma inesperada lucidez.
Ontem... eu
fui ao teatro!
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Obrigada,
Awêry Vivências Cênicas. Awery!
(Fotografias lindas da Erica Daniela linda) |